Caros Subscritores,
As tensões entre a Rússia e a União Europeia têm aumentado no que diz respeito também às questões económicas. Enquanto a Comissão Europeia afirma que a disponibilidade de alimentos na UE não está em causa…
…o atual presidente de França, Emmanuel Macron, propôs vouchers de alimentos para as famílias francesas mais carenciadas:
Isto no contexto das eleições presidenciais francesas, que são no dia 10 de abril:
On April 10, France goes to the polls to pick its next president
Para além das questões alimentares, as questões energéticas também poderão ser um problema…
…porque nenhuma das partes parece estar disposta a ceder:
Os motivos pelos quais o gás é importante para a União Europeia podem ser consultados aqui:
A Europa é fortemente dependente das importações de gás natural:
De seguida apresento as diferenças entre o Liquefied Natural Gas (LNG) e o Gás Natural dos gasodutos…
…e existem inúmeras publicações a explicar porque motivo a Europa não conseguirá utilizar apenas o LNG no curto/médio-prazo:
- What LNG Can and Cant Do to Replace Europe’s Imports of Russian Gas
- Europe battles to secure specialized ships to boost LNG imports
Ainda assim, existem algumas indústrias que poderão beneficiar da importação de LNG. Em primeiro lugar temos as empresas de transportes marítimos ligadas ao LNG… terei de rever as que foram analisadas porque sei que havia pelo menos uma, em segundo lugar as construtoras e as produtoras de bens ligados ao LNG e em terceiro temos as empresas que já operam terminais LNG. Pelo seguinte mapa…
…podemos observar que Portugal tem no seu território um terminal LNG (GNL em português) operado pela REN…
…e é sobre ela que recairá a análise de hoje:
Desde 24 de fevereiro, dia da invasão da Rússia à Ucrânia, as ações da REN valorizaram 10,6%.
Resultados
No passado dia 24 de março foram apresentados os resultados de 2021 que podem ser consultados de seguida:
O relatório anual completo ainda não foi publicado e esta apresentação não tem quase nenhuma informação sobre o LNG. Primeiro analisaremos os resultados e só depois procuraremos informações sobre o LNG.
O resultado líquido diminuiu 11,1% face a 2020…
…devido à contração que se verificou no EBITDA:
Por sua vez, o EBITDA diminuiu porque o RAB (Base de Ativos Regulada) diminuiu…
…e também porque a remuneração que está indexada às yields também diminuiu:
Ora se a base de ativos regulada diminuiu e a sua remuneração também contraiu, por consequência diminuiu o EBITDA e o Resultado Líquido. Do outro lado da balança temos a diminuição do custo da dívida dos 1,8% para os 1,6%. A dívida líquida da REN foi reduzida em 380 M€ e é agora de 2.362 M€:
Relativamente aos dividendos temos a seguinte informação:
Tendo em conta o preço de 2,78 € por ação o dividend yield bruto é agora de 5,5%.
Desenvolvimento
Portugal não tem reservas de gás natural. O gás é importado dos seguintes países (dados do relatório anual de 2020):
Como já vimos anteriormente no que toca ao EBITDA o peso do segmento internacional é inferior a 3%, pelo que podemos dizer que quase todo o negócio da REN é feito em Portugal. Convém referir que a REN é a concessionária do terminal LNG…
…pelo que não sei se esta terá capacidade para avançar com um eventual projeto de expansão. Eu diria que a REN é responsável por manter o terminal LNG em funcionamento, mas não é ela que toma as decisões estratégicas do mesmo.
De referir também que para ligar Sines à Europa são necessários novos gasodutos de ligação entre Espanha e França. Estes novos gasodutos poderão demorar uns 5 ou 6 anos a serem construídos.
As estimativas dos analistas são as seguintes:
Como podem ver, os analistas não veem mudanças significativas nos próximos anos.
Conclusão
A cotação subiu um pouco, o dividendo diminuiu e o dividend yield é agora de apenas 5,5% (brutos). Não vejo como a REN possa beneficiar em grande escala da atual situação geopolítica.
Comentário do César
Obrigado Artur por esta análise completa, que explicou bem a importância – e as limitações – do terminal LNG que a REN opera em Sines.
Em relação aos resultados, gostei da diminuição expressiva da dívida líquida e, tendo em conta a subida dos yields das OTs nacionais…
…é expectável que o RAB aumente em 2022.
Começo a pensar de forma diferente acerca da REN, no seguinte sentido: desde 2015 que fui considerando que uma subida de juros poderia prejudicar a REN, por esta se encontrar bastante endividada, porém entretanto a dívida líquida foi algo reduzida (talvez não tanto como deveria, por causa dos dividendos) e ficámos a saber que a remuneração dos ativos da REN está indexada ao yield da dívida pública portuguesa.
Ou seja, pesando bem os fatores, a subida de juros beneficia mais do que prejudica os fundamentais da REN e talvez seja por isso – também por causa da especulação em relação ao terminal LNG de Sines (largamente infundada, como demonstraste) – que a REN tem valorizado.
De qualquer modo a REN continua a ser uma dividend play – talvez ao estilo do Investidor Prudente – que se deve comprar baixo para vender alto e não comprar alto (como agora), para vender ainda mais alto. Certamente não tem lugar no TOP10 Lisboa, que ambiciona obter um retorno médio anual em torno de 15%.
E tem conseguido, neste momento está nos 16,1%, mas não foi com ações do género da REN.