Eu, como tantos outros, passei a maior parte da minha carreira de analista e investidor em ações pensando que a Análise Técnica (AT) e a Análise Fundamental (AF) seriam complementares. Daí que a ideia que tinha era que, quanto mais conhecimento acumulasse sobre ambas, maior probabilidade de sucesso teria na seleção de ações e maior retorno a longo prazo.
Em 2005 o meu amigo Pedro Miranda cunhou o termo Análise TecniMental, que seria a junção dos dois grandes ramos de análise.
Porém, à medida que fui colecionando experiências nas ações, fui dando cada vez mais peso à Análise Fundamental na tomada de decisões até que, em 2016 (vinte anos depois de ter começado), eu diria que cheguei ao pleno na Análise Fundamental.
Hoje em dia reconheço que a AT e a AF não são complementares. São antagónicas.
Se preferir veja o vídeo:
Aqui identifico 10 pontos em que se diferenciam e chegam mesmo a confrontar-se:
1º – A Análise Técnica considera que o mercado é eficiente e que tudo o que há para saber sobre uma ação está refletido na cotação e volume. A Análise Fundamental considera que o mercado é ineficiente no curto/médio prazo e que só é eficiente no longo prazo;
2º – A Análise Técnica é mais usada pelos traders de curto prazo. A Análise Fundamental é mais usada pelos investidores de longo prazo. As indicações dadas pelas duas análises costumam contradizer-se, especialmente nos momentos fulcrais de tomada de decisão;
3º – Os traders baseados na Análise Técnica esperam que o mercado lhes diga o que fazer. Os investidores baseados na Análise Fundamental têm a sua própria opinião;
4º – Os traders que utilizam a Análise Técnica para as suas decisões têm dúvidas acerca de que conjunto de indicadores utilizar: os de tendência, ou os que indicam estados overbought/oversold? Os investidores que baseiam as suas decisões na Análise Fundamental não se preocupam com a evolução da cotação, nem com a velocidade do movimento entre o ponto A e o ponto B;
5º – Uma Análise Técnica pode ser feita em 5 minutos. Uma Análise Fundamental demora no mínimo 3 horas;
6º – Os traders baseados na Análise Técnica têm de estar permanentemente atentos à cotação, pois as suas decisões dependem da cotação. Os investidores baseados na Análise Fundamental trabalham muito antes de tomar uma decisão, mas depois deixam que seja o capital e o tempo a trabalhar;
7º – Os traders que consideram a Análise Técnica são atraídos pelo volume, pela quantidade de ações transacionadas …Os investidores que consideram a Análise Fundamental sabem que muitas vezes o volume elevado advém de um passado de emissão de novas ações e diluição do valor dos acionistas. E também sabem que, quanto maior a liquidez, especialmente nas micro e small caps, menor o retorno em termos de longo prazo;
8º – Os traders baseados na Análise Técnica são atraídos pelas ações de baixa cotação. Os investidores baseados na Análise Fundamental sabem que a cotação considerada isoladamente é irrelevante;
9º – Os traders baseados na Análise Técnica saem muitas vezes das ações e vão para outros tipos de produtos financeiros, alguns deles tóxicos, como CFDs, Forex, ETFs alavancados, cripto-moedas, etc. Os investidores que são versados na Análise Fundamental ficam nas ações, que são títulos representativos da propriedade de empresas;
10º – A Análise Técnica é mais usada pelos micro-investidores, com pouco capital para investir. A Análise Fundamental é utilizada especialmente pelos grandes investidores. Eu diria que para se chegar a grande, é preciso pensar e agir como os grandes.
Posto isto, gostaria também de dizer que nos dois ramos existem análises mais úteis e menos úteis.
Por exemplo, penso que na AT as análises focadas na tendência são mais úteis do que as que se focam na velocidade e/ou amplitude dos movimentos. Na AF, as que identificam estados de subavaliação/sobrevaliação são úteis, mas não tanto como aquelas que identificam e prevêem tendências fundamentais de longo prazo.
No Borja on Stocks temos a missão de analisar sistematicamente, do ponto de vista fundamental, as 300 maiores empresas cotadas na Euronext. O objetivo é selecionar as mais atrativas para investimentos a longo prazo.
Atenciosamente,
César Borja
Analista de Ações Independente