10 Coisas que Precisa de Fazer ANTES de Comprar uma Ação

1ª – Avaliar a dispersão do seu Portfolio ✅

Nos 24 anos de contactos que levo com investidores em ações, a causa n.º 1 para perdas avultadas (ou totais) é a concentração excessiva do capital em apenas uma ação.

Algumas explicações comuns dos investidores que se arrependem de alguma vez terem tido a ideia de investir na Bolsa são:

  •  “Quando vi as ações do BES a cair 50% não resisti e investi tudo no BES. Consequentemente perdi tudo de um dia para o outro”;
  • “Fui investindo sempre nos aumentos de capital do BCP e hoje tenho mais de 80% do capital investido em ações do BCP, a perder mais de 70%”
  • “A Portugal Telecom era uma empresa sólida que pagava bons dividendos, pelo que investi mais de metade da minha carteira nessas ações. Agora a empresa chama-se Pharol e a cotação está 95% mais baixa”

Etc, etc.

Por outro lado, todos os que investiram em ações de forma diversificada e equilibrada mantém-se relativamente satisfeitos e otimistas em relação aos seus investimentos, ainda que, em média, a Euronext Lisboa tenha sido uma das Bolsas com pior performance do mundo nos últimos trinta e três anos.

Aqueles que fazem uma diversificação internacional, por exemplo por outras praças europeias e/ou americanas, encontram-se numa posição confortável.

Daí que seja imperioso que, antes de comprar uma ação, verifique a dispersão do seu Portfolio e veja se o capital está distribuído de forma equilibrada por pelo menos 5 ações diferentes, sendo que o ideal será espraiar o seu capital por 20 ações diferentes.

Por uma questão de controlo do risco nunca deverá permitir que uma ação tenha um peso superior a 25% no total da sua carteira.

2ª – Ver a evolução do N.º de Ações Emitidas e da Capitalização Bolsista 📈

Existe um paradoxo latente no mercado de ações.

De um lado temos investidores que querem que as suas ações valorizem e/ou que distribuam dividendos. Do outro lado temos muitas empresas que estão no mercado de capitais com necessidades de financiamento, ou seja, precisam que os investidores lhes forneçam capital.

A função social do mercado de ações não é enriquecer os investidores… a função social do mercado de ações é financiar as empresas!

O mercado de ações existe como um mecanismo de financiamento às empresas, porém o que os investidores querem é investir em empresas que não só não precisam de financiamento, como estão em boas condições de crescer e distribuir parte dos seus lucros pelos acionistas.

Existe então uma distinção crucial que é necessário fazer antes de comprar uma ação: a empresa pertence ao grupo das que precisam de financiamento ou ao grupo das que não precisam?

É que as que precisam terão tendência a emitir mais e mais ações, diluindo fortemente o valor dos acionistas no processo.

Foi isto que aconteceu em ações como o Banif, BES, BCP, Compta, Reditus, Sonae Indústria, Vista Alegre Atlantis, etc. Vejamos por exemplo um gráfico com a evolução do N.º de Ações emitidas pelo BCP:

O N.º de Ações emitidas pelo BCP multiplicou-se por mais de 80 nos últimos 27 anos, pelo que é natural que a cotação tenha caído mais de 95%:

Do outro lado, empresas como Altri, Corticeira Amorim e Semapa mantiveram o N.º de Ações emitidas e chegaram mesmo a comprar bastantes ações próprias e isso explica parcialmente a sua tendência ascendente ao longo dos anos. Vejamos por exemplo o gráfico de longo prazo da Corticeira Amorim:

Antes de comprar uma ação deve averiguar se a empresa é daquelas que tem um histórico de emissão de novas ações ou se irá precisar de emitir novas ações no futuro, pois o que você quer é investir em empresas que não precisam de financiamento, ou precisando, que não irão procurar obtê-lo no mercado de capitais.

Uma forma de averiguar isto é também ver a estrutura acionista: normalmente as empresas que são controladas por um grande acionista dominante não emitem novas ações, pois esse acionista controlador não pretende ver a sua posição diluída e em princípio não quererá investir ainda mais na empresa. A Corticeira Amorim – uma das estrelas da Euronext Lisboa – é um exemplo paradigmático.

3ª – Avaliar o Balanço 📊

Atualmente a primeira coisa que vou ver quando quero analisar uma empresa é o Balanço, nomeadamente as seguintes três métricas:

A – Cash e Equivalentes

Aqui estão incluídos o dinheiro em caixa, os depósitos bancários e os investimentos de curto prazo.

B – Dívida Financeira

É a dívida, de curto e de longo prazo, em que a empresa tem de pagar juros. Normalmente nesta rubrica encontramos créditos bancários e obrigações emitidas.

C – Dívida Líquida

Corresponde à Dívida Financeira menos o Cash e Equivalentes.

Se a Dívida Líquida for negativa, ótimo, significa que a empresa tem Net Cash, ou seja, tem mais dinheiro do que aquele que deve.

Naturalmente, quanto maior a Dívida Líquida pior para as perspetivas da empresa, pois estará mais vulnerável a uma quebra nas Receitas e/ou Lucros e ao risco de subida das taxas de juro.

Depois convém comparar o montante da Dívida Líquida com outros dados fundamentais, sendo que a comparação preferida dos analistas é com o Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization (EBITDA):

Net Debt to EBITDA = Net Debt / EBITDA

Regra geral, quando este rácio está abaixo de 3 é considerado razoável, ou controlado, e acima de 3 costuma considerar-se que a empresa está endividada, ou alavancada.

Claro que a Dívida é a que é e tem sempre de ser paga, enquanto que o EBITDA é mais volátil, tanto pode aumentar como diminuir, tendo em conta as operações da empresa.

Pessoalmente também aprecio comparar o montante da Dívida Líquida com a Capitalização Bolsista e com o nível de Vendas atual, para ter uma noção do peso dessa dívida em termos relativos e comparáveis entre empresas.

Evidentemente existem muito mais rácios do Balanço que convém conhecer, mas se os investidores tivessem apenas noção do montante da Dívida Líquida e o comparassem com outros dados fundamentais e com outras empresas do mesmo setor já diminuiriam significativamente o n.º de erros que cometem.

Até porque normalmente são as empresas mais endividadas – e por tal mais necessitadas de capital – que mais procuram angariar novos investidores através de press releases exageradamente positivos e apresentações “rosadas” dirigidas aos investidores.

As que têm Net Cash positivo podem ser mais discretas – porque não precisam de capital – e por tal passar despercebidas junto dos investidores.

Vemos aqui novamente um certo conflito de interesses entre as empresas e os investidores: as empresas que procuram investidores muitas vezes são os piores investimentos e as empresas que não fazem publicidade podem ser as que são fundamentalmente mais atrativas e que por tal terão mais propensão a valorizar.

4º – Conhecer os fatores de risco ✋

Por falar em “risco”, as empresas são simpatiquíssimas e partilham com os potenciais investidores os principais riscos para a sua atividade. Esta é uma secção obrigatória no Relatório e Contas anual.

Quer dizer, você se for comprar um carro em segunda mão consulta um mecânico, abre o capô, vê os pneus, o nível do óleo e mais uma série de “indicadores”, mas depois acha que dá muito trabalho ver quais são os riscos principais do negócio em que irá investir? Não faz sentido…

Antes de comprar uma ação deverá consultar o Relatório e Contas e ficar ciente dos riscos do negócio.

Normalmente os investidores quando tomam consciência dos riscos perdem logo a vontade de comprar as ditas ações, até porque as empresas normalmente exageram e enfatizam demasiado os riscos que correm, para depois estarem protegidas de processos em Tribunal no caso de as coisas correrem realmente mal.

Mas, na eventualidade de, depois de ler os riscos, mesmo assim tiver vontade de comprar as ações… aí é que a coisa começa a ficar interessante, pois poderá realmente estar perante uma oportunidade de investimento a médio/longo prazo.

Então… nesta fase já verificou o equilíbrio do seu Portfolio e sente-se confortável com o risco de investir nestas ações. O que é que precisa de saber a seguir?

Precisa de ver qual é o potencial de valorização, certo? E começa por onde? Por ver se a empresa tem uma tendência de crescimento das suas Vendas a longo prazo e a que taxa média anual.

5º – Determinar a Taxa Média de Crescimento Anual das Vendas ✔️

Infelizmente nem todas as empresas exibem uma tendência de crescimento das Vendas Anuais como a Jerónimo Martins…

…que passou de Receitas de 3 915 M€ no ano 2000 para os 18 638 M€ em 2019. Dezanove anos passaram e as Vendas anuais quase quintuplicaram.

Claro que a cotação refletiu estes desenvolvimentos fundamentais, as ações da Jerónimo Martins fecharam o ano 2000 nos 1,88 € e agora estão nos… deixem-me ver… 15,35 €:

Para que uma empresa aumente o seu Valor de Mercado, a sua Capitalização Bolsista, em termos de longo prazo e de forma sustentada é necessário que consiga vender mais dos seus produtos e/ou serviços.

As cotações não podem subir de forma sustentada apenas porque sim, é preciso que o negócio subjacente realmente se vá valorizando ano após e ano e, regra geral, uma empresa que vende mais… vale mais!

Claro que o que interessa mais é o Lucro, mas dificilmente o Lucro se poderá expandir sem que haja também um incremento das Receitas… quer dizer, poder pode, através do corte de custos, mas essa é sempre uma estratégia com limites bem definidos e que dificilmente entusiasmará suficientemente os investidores.

Antes de comprar uma ação você precisa de ver se ela tem potencial para aumentar as suas Vendas anuais… e como é que vê isso? Pode obter as estimativas dos analistas que seguem as empresas, mas sabe qual é a principal fonte deles? É uma que você também pode ter, o track record, ou seja, a tendência do passado!

Na maior parte dos casos (como acontece por exemplo na Jerónimo Martins) o que os analistas fazem é extrapolar a tendência do passado para o futuro e você pode facilmente fazer o mesmo.

Agora, investir numa ação sem ter a mais pequena ideia da tendência das Vendas Anuais? Sem sequer pensar se a empresa poderá vir a vender mais no futuro, ou não? Se tem boas oportunidades de expansão do seu negócio? Se demonstrou claramente a sua vantagem competitiva no mercado, e a competência da sua gestão, através de um crescimento sustentado das Vendas anuais?

Antes de comprar a próxima ação você precisa de visualizar um gráfico com a evolução das Vendas anuais. Precisa de conhecer a história para ter uma boa ideia do que vai acontecer no futuro.

Ah, é verdade, é muito fácil calcular a taxa média de crescimento anual de qualquer variável, a fórmula é a seguinte:

Taxa média de crescimento anual = ((Valor Final / Valor Inicial)^(1/N.º de Anos)) – 1

Nota: o valor deverá ser apresentado em percentagem

Calculando para a Jerónimo Martins:

Taxa média de crescimento anual = ((18.638 / 3.915)^(1/19)) – 1 = 8,6%

Nota: como faço muitos cálculos deste género adquiri uma HP 12c Platinum, que recomendo

E qual foi a taxa média anual de subida da cotação? 11%… não foi por acaso.

6º – Estudar a evolução do Resultado Líquido 📜

No tópico anterior referi que “claro que o que interessa mais é o Lucro…” e é verdade, os investidores em ações valorizam as empresas muito mais por aquilo que elas lucram do que por aquilo que vendem.

Existem muitas empresas cotadas em Bolsa que vendem muito, mas lucram pouco e consequentemente… valem pouco. Os negócios de distribuição (como por exemplo a Inapa) são exemplos de empresas com margens de lucro praticamente nulas e que por tal são pouco atraentes.

Se dividirmos o Resultado Líquido anual pelo N.º de Ações emitidas obtemos o Lucro por Ação. As mudanças no Lucro por Ação são o principal fator explicativo das grandes tendências de subida e descida das cotações.

Se invertermos o Lucro por Ação obtemos aquilo que em tempos apelidei de Juro do Lucro e que poderá ser mais facilmente entendível pelos investidores:

Juro do Lucro = Lucro por Ação / Cotação

Nota: em inglês o “juro do lucro” corresponde ao earnings yield

Se uma empresa der um Lucro de 1 € por ação e estiver cotada a 10 € por ação, o seu Juro do Lucro será de 10%. Porém, se, ora porque as Vendas aumentam, ora porque a margem líquida se expande (ou, o que é mais normal, uma combinação dos dois efeitos) o Lucro por Ação duplicar para 2 €, o Juro do Lucro passará para 20% o que tornará as ações extraordinariamente atrativas e inevitavelmente levará a grandes valorizações.

Se uma empresa que lucra X passar a lucrar 2X… é natural que passe a valer mais ou menos o dobro. E se o Lucro anual cair para metade… é provável que a cotação caia uns 50%.

Claro que existem muito mais fatores a considerar, mas o Lucro por Ação é o mais importante de todos.

Se o N.º de Ações emitidas tiver sido, historicamente, estável, podemos considerar as variáveis Resultado Líquido e Resultado por Ação mais ou menos equivalentes e estudarmos somente a evolução do Resultado Líquido (RL).

É muito importante procurar discernir como vai ser o RL da empresa nos próximos anos… e o que é que ajuda muito a fazer essa previsão? Evidentemente, ajuda saber o que aconteceu no passado… como é que a empresa se aguentou nas últimas duas recessões económicas? Teve Prejuízos? Porquê? Conseguiu continuar a lucrar? Como?

Se souber o que aconteceu no passado terá muito mais probabilidade de acertar naquilo que vai acontecer no futuro, ou seja, terá mais capacidade para acertar na direção do Lucro por Ação… e o Lucro por Ação é o fator principal, aquele que em grande parte determina, a evolução da cotação.

O que é que pode esperar de uma empresa que, nos últimos dez anos, lucrou mais ou menos o mesmo ano após ano? Se a ação estiver corretamente avaliada pelo mercado (lá chegaremos) o que pode esperar é… mais do mesmo! Se a empresa lucra mais ou menos o mesmo é certo que valerá mais ou menos o mesmo.

E se for uma empresa cíclica, daquelas que lucram muito nas expansões e dão muito prejuízo nas recessões? O que é que poderá prever que vai acontecer após fortes prejuízos? Que eventualmente irão surgir bons lucros, uma vez que a empresa é cíclica.

Antes de comprar a próxima ação é necessário que conheça a evolução do Resultado Líquido no passado, quantos mais anos, melhor, para ter mais consciência daquilo que pode esperar no futuro… para poder formar as suas expetativas, que depois poderão ser, ou não, confirmadas pelos desenvolvimentos.

Vejamos por exemplo o gráfico com a evolução do Resultado Líquido da ST Microelectronics, uma empresa europeia da indústria dos semicondutores:

Vê-se que existiu uma forte ciclicidade no passado, que poderá voltar a acontecer no futuro, embora a indústria dos semicondutores atualmente aparente ser menos impactada pelo ciclo económico.

7º – Ver o nível e a evolução das margens

Por vezes existem variações nas ações superiores a 500% sem que o nível de Vendas da empresa se altere significativamente. Isto porque uma empresa pode lucrar muito ou pouco por unidade vendida.

Por exemplo, uma empresa poderá lucrar apenas 1 cêntimo por cada euro vendido e nesse caso tem uma margem líquida de apenas 1%:

Margem Líquida = Resultado Líquido / Vendas

Mas imaginemos que chega uma gestão mais competente, que torna todo o processo produtivo mais eficiente, que baixa os custos com juros, que consegue fazer o mesmo com menos recursos e que a empresa passa a lucrar 5 cêntimos por cada euro vendido. O que é que previsivelmente acontece ao valor desta empresa?

Quintuplica! Ora, se a empresa lucra cinco vezes mais, considerando que tudo o resto é constante, é natural que valha cinco vezes mais. Traz cinco vezes mais retorno aos seus acionistas, o seu juro do lucro é cinco vezes superior, portanto a empresa deverá valer umas cinco vezes mais.

Existem vários fatores que poderão ter influência nas margens de lucro, que são várias, não devemos considerar apenas a margem líquida.

Temos também a margem bruta, a margem EBITDA, a margem EBIT (ou margem operacional), etc.

Vejamos por exemplo um gráfico com a evolução das margens de lucro da EDP ao longo dos anos:

As margens eram significativamente mais elevadas há vinte anos do que são hoje, o negócio tornou-se menos lucrativo, possivelmente por causa da entrada de alguns players espanhóis no mercado de eletricidade nacional, ou porque os custos com juros afetaram a rendibilidade da empresa. Seria uma questão a aprofundar que não cabe neste pequeno e-book.

8ª – Calcular os principais rácios de valorização e conhecer os níveis máximos e mínimos em termos históricos

Recapitulando, antes de comprar a ação, já verificou o seguinte: a dispersão do seu Portfolio, a evolução do n.º de ações emitidas, o balanço, os fatores de risco, a evolução das vendas anuais, do resultado líquido e das margens de lucro.

Agora vamos falar de outro fator de importância crucial, que é o preço!

Qual é o preço da empresa em que está interessado? Atenção que não pode de forma alguma confundir o preço da empresa com a cotação da ação, pois a cotação da ação é o preço de uma única ação.

Depois é preciso multiplicar a cotação pelo n.º de ações emitidas pela empresa para obter o seu Preço Total, que é equivalente ao Valor de Mercado ou Capitalização Bolsista:

Valor de Mercado = Cotação * N.º de Ações Emitidas

Caso tenha tido dúvidas nesta parte sugiro o seguinte vídeo: Preço da Empresa

Só se considerar o preço total da empresa atrativo (face aos seus fundamentais) é que poderá, em termos economicamente racionais, considerar atrativa a compra de uma parte da empresa, que é como quem diz, de algumas centenas ou milhares de ações.

Tendo então o Preço Total da empresa deverá comparar esse preço com que métricas?

Fará por exemplo sentido comparar o Preço Total da empresa com o seu volume de vendas anual, ou seja, faz sentido calcular o múltiplo das vendas, mais conhecido por Price to Sales Ratio:

Price to Sales Ratio = Preço Total da Empresa / Vendas do último ano

Se uma empresa tiver um Valor de Mercado de 1 500 M€ e tiver vendido 1 000 M€ em 2019, o seu Price to Sales Ratio (PSR) será 1,5, ou seja, a empresa estará avaliada em 50% mais do que vendeu no último ano.

Evidentemente, ceteris paribus, ou seja, mantendo tudo o resto constante, quanto mais baixo o PSR mais atrativa estará a empresa e quanto mais alto, menos atrativa.

O segundo rácio de valorização que faz sentido calcular (e ter uma noção dos seus níveis em termos históricos) é o conhecidíssimo Price to Earnings Ratio (PER):

PER = Valor de Mercado / Resultado Líquido

Claro que, quanto mais alto o PER, mais sobreavaliada estará a empresa e quanto mais baixo, mais subavaliada.

Parece-me seguro que, se os investidores tivessem consciência do PER, não teriam ido à OPV da Impresa no ano 2000, ou à da Sonaecom pela mesma altura:

Parece que hoje em dia estão menos novatos no mercado e foi por isso que empresas como a Sonae MC e a Science4you despertaram pouco interesse, porque estavam a ser vendidas muito caras.

Em relação à Raize, também foi vendida com múltiplos de valorização muito altos, mas aí existia a compensação do forte potencial de crescimento e expansão das margens de lucro.

Um terceiro rácio de valorização que pode ser calculado (talvez a sua popularidade seja superior à sua utilidade) é o Price to Book Value (PBV):

PBV = Valor de Mercado / Capital Próprio

Aqui trata-se de comparar o valor atribuído pelos investidores à empresa no mercado com o valor da sua situação líquida em termos contabilísticos, ou seja, o seu Capital Próprio.

Disse que este rácio não era assim tão importante porque na realidade as empresas valem muito mais por aquilo que conseguem lucrar para os seus acionistas (os donos das empresas) do que pela mera diferença entre o seu Ativo e o seu Passivo.

Estes três são os principais rácios de valorização, mas existem muitos mais, como por exemplo o EV / EBITDA, entre outros.

Muitos erros foram cometidos, e muito dinheiro foi perdido ou não foi ganho, por causa do desconhecimento em relação aos níveis dos rácios de valorização.

Por exemplo, será surpresa para alguém que a Jerónimo Martins, quando está valorizada com um PER em torno dos 25…

…a seguir caia, e quando está valorizada com um PER em torno de 16, a seguir suba?

Ou, terá ficado surpreendido o investidor que, tendo noção que a Ramada estava a transacionar com um PER em torno de 3 em 2011-12…

Nota: resultado líquido de 17 e 18 corrigido de fatores extraordinários

… a seguir tenha subido quase 3 000%?

Talvez a magnitude do movimento tenha sido inesperada, mas a direção era mais ou menos evidente.

É bom que, antes de comprar as próximas ações, tenha a noção exata do múltiplo que está a pagar pela empresa… qual é o PSR? Qual é o PER? Qual é o PBV?

Senão é como se fosse comprar um carro (sempre o exemplo do carro?) sem saber qual é o preço… “o carro é bom, compro!”

Mais tarde descobre que comprou um bom carro, por exemplo um BMW, mas como pagou 200.000 € por ele o seu valor caiu 90%. O carro até era bom, o preço é que estava muito inflacionado!

Convém referir que existe uma nuance nas análises baseadas nos rácios de valorização que é muitíssimo importante: é que as empresas que têm perspetivas de crescimento merecem um múltiplo de valorização mais elevado do que aquelas que têm perspetivas sombrias.

Isto é, uma empresa que está valorizada com um PER de 20 até pode ser mais atrativa do que uma que está com um PER de 7, porque a primeira deverá conseguir aumentar substancialmente o seu Lucro por Ação nos próximos anos e a segunda… está a minguar e pode até dar Prejuízos no futuro.

Daí que, mais do que fazer contas com os números reportados, seja imprescindível ter uma visão de futuro para a evolução dos fundamentais de cada empresa.

9ª – Construir uma visão de futuro para cada empresa

É difícil, mas os investidores em ações têm de pelo menos tentar prever o futuro, não podem simplesmente ir reagindo aos acontecimentos.

Isto porque o mercado de ações vai “descontando” o futuro e as notícias de hoje… muitas vezes já são informação velha e recalcada, que muitos agentes económicos já conheciam ou, pelo menos, antecipavam.

Daí que muitas vezes as cotações desçam apesar de serem divulgadas notícias positivas ou subam mesmo quando as notícias são negativas.

“Já estava descontado” é uma frase muito comum nos mercados financeiros.

Mas aqui não estamos a falar de prever o futuro a curto prazo, as notícias da próxima semana, mas sim de ter uma verdadeira visão de futuro para a empresa em questão.

De forma simplificada, podemos utilizar três métodos para obter uma visão de futuro:

1 – Futuro como extrapolação do passado

2 – Futuro como evolução do passado

3 – Futuro como rutura com o passado

Para cada situação, ou ação específica, será mais apropriado utilizar um dos três métodos.

Quando extrapolamos estamos apenas a estender as tendências do passado para o futuro. Quando há uma evolução é porque existem certas métricas (por exemplo a margem líquida) que se alteram de forma progressiva. E quando há uma rutura significa que vai haver um catalisador que irá transformar completamente os fundamentais de uma empresa… significa que o futuro não terá nada a ver com o passado.

Construir uma visão de futuro para cada ação é útil porque poderá compará-la com a realidade atual e também depois compará-la com os desenvolvimentos, para ver se a evolução financeira da empresa corresponde às suas expetativas, se as supera, ou se as defrauda.

É também através deste método que saberá exatamente quando deve comprar ou vender uma ação.

Se comprar a próxima ação sem ter uma visão de futuro para a empresa estará a agir num vazio de ideias… não sabe porquê que compra, por isso, muito provavelmente, também não saberá quando deve vender.

10ª – Comparar a visão de futuro com a realidade atual para obter uma taxa de retorno prevista

A visão de futuro que deverá construir não poderá ser um conjunto de banalidades subjetivas, terá de ser constituída por ideias muito concretas (com números associados) acerca da evolução das métricas fundamentais das empresas.

Quer que lhes chame estimativas? OK, eu chamo estimativas, só que, ao contrário dos analistas que seguem as empresas e lançam recomendações e price targets a 12 meses (e que raramente acertam – precisamente porque são previsões de curto prazo), aqui queremos prever os desenvolvimentos a 10 anos, a 20 anos.

Não o número exato de cada ano, mas as tendências e as médias a longo prazo, de tal modo que não importará muito acertar num ano ou noutro, mas antes acertar na direção e mais ou menos na média.

Isto porque, olhando para a realidade, para os gráficos das métricas fundamentais de muitas empresas cotadas na Europa e nos Estados Unidos nos últimos vinte anos, verificamos que NUNCA existiu linearidade perfeita.

Existiram tendências de longo prazo, é certo, com um impacto tremendo nas cotações, sem dúvida, mas a evolução não foi linear.

Notas Finais:

  1. Reescrevi este artigo para me relembrar dos fatores mais importantes quando se analisa uma ação;
  2. Desde o colapso relacionado com o grande confinamento e subsequente recuperação motivada pelos estímulos fiscais e orçamentais que os fundamentais das empresas e as visões de médio/longo prazo se tornaram menos importantes. No entanto, penso que no futuro a médio prazo o caminho para a outperformance voltará a ser o que sempre foi: análises fundamentais profundas e de qualidade;
  3. Nos últimos tempos não tenho utilizado o método descrito acima de forma integral, porque as condições de mercado exigem uma muito maior rapidez e flexibilidade. Nesta fase do mercado o contexto histórico de cada empresa tornou-se menos relevante, precisamente porque vivemos numa época sem precedente histórico: nunca o Governo tinha ordenado o fecho de determinados setores, prejudicando os acionistas de empresas desses setores, enquanto manteve outros setores operacionais, beneficiando os acionistas de empresas desses setores;
  4. A reabertura da economia e progressivo regresso à normalidade irá também movimentar o Borja on Stocks no sentido das análises e recomendações baseadas na estrutura original, dos anos de 2015-19;

Bom fim-de-semana!

César Borja

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